02 dezembro 2006

O Público, as mães e as outras

Uma página de publicidade a um livro, seu ou dos outros, não custa nada a um jornal e nem parece mal. Agora, se o jornal é o Público, um jornal de «referência», e o livro «A Mãe na Poesia Portuguesa», ainda que uma «antologia inédita» de Albino Martins, então é preciso começar a desconfiar, ainda por cima vivendo-se numa época em que se travará, em Portugal, mais uma guerra à volta do aborto. Estranhamente, o dispositivo do anúncio com um singelo «Obrigado eu.» a meio da página, parece um argumento daquele discurso anti-aborto em que o adulto actual agradece por ter nascido, ou por ter tido a oportunidade de nascer. «Neste Natal», o «Público presta a merecida homenagem a todas as mães», e ao fazê-lo parece esquecer-se das outras mulheres, das que não são mães, qualquer que seja a razão, das que nunca o foram, das que nunca o serão. Quer dizer que o sentido de oportunidade desta «homenagem às mães» é forçado e extemporâneo, a não ser que o Público vá fazer o que a Renascença já fez, mas não tenha ainda tido a coragem para vir anunciá-lo e, por enquanto, vai avançando com estes pequemos passos de homenagens, a ver o que é que dá.
Tudo isto pode ser perfeitamente inocente. Mas nos tempos que correm e por causa dos afrontamentos, mais vale desconfiar e prevenir.