12 novembro 2006

A maldade chinesa

Quando é público que a China abre linhas de crédito para diferentes países africanos sem lhes perguntar se querem mudar de regime, estranha-se, mas aceita-se. Mas quando são tornados públicos os valores envolvidos nestas operações financeiras, o tipo de negócios estabelecidos, as alterações económicas que daí advêm, as matérias-primas que estão em causa, os níveis de desenvolvimento estimados e, por último, a percepção de que em África também se fazem sentir as oportunidades da globalização, e ainda por cima é organizada uma cimeira China-África, onde estão representados quase todos os países do continente africano, então, sobram as críticas contra a chinização da economia africana.
Na realidade, há aqui dois movimentos complementares: por um lado, há uma ponta de inveja por os chineses serem capazes de fazerem - e, aparentemente, com resultados - o que o ocidente não fez nem conseguiu fazer, que é tratar África e os países africanos como soberanos e capazes de celebrarem acordos económico-financeiros, e de gerirem, entregues a si próprios, tudo o que lhes interessa sem ninguém lhes dar lições de bom comportamento político; não se ouve dizer que a China presta ajuda financeira, mas que faz negócios. Ora, não era Tony Blair (e Bono Vox) que tinha a ideia de injectar milhões de euros de ajuda em África? Onde estão? Quando será? Estará a China a fazer o que o Ocidente quereria fazer, só que de outra maneira? Por outro lado, não quereria o Ocidente ter-se posto no lugar da China e substitui-la como a maior potência com negócios em África?
Depois, falar de democracia e de direitos humanos quando o estômago não tem nada para digerir, quando não há classes médias desenvolvidas, quando tudo falta incluindo a capacidade de sobrevivência diária, não deixa de ser, à sua maneira, uma caricatura da sensibilidade ocidental. Se se pensa que é preciso implantar primeiro a democracia e desenvolver depois, então mais vale convidar Bush e o que resta da sua administração para tratar do assunto.