21 março 2007

Retirar um primeiro-ministro do poder

«Chegaram os cinco [Cavaco, Guterres, Barroso, Santana, Sócrates] a primeiro-ministro sem uma experiência séria e pessoal do "monstro" que iam dirigir e com um absoluto desconhecimento do país. Cada um via Portugal e os portugueses pela sua pequena fresta (das Finanças, dos Estrangeiros, da Cultura ou do Ambiente). Não passavam os cinco de amadores, sem maneira de avaliar ou de medir o que lhes diziam e, como é óbvio, só nos deixaram sarilhos.
Surpreendentemente, esta sociedade obcecada com a segurança e a "excelência" não exige qualquer espécie de qualificação política ao primeiro-ministro. Não ocorreria a ninguém ser operado por um estagiário. Mas ninguém se importa de ser governado por um conspirador de sótão, um secretário de Estado da Cultura ou um ministro do Ambiente.» Vasco Pulido Valente (‘P’, 18/03/07)

A questão da «excelência» é muito bem colocada, no contexto dos ocupantes do governo, em Portugal, ainda que esta questão adquira maior força quando ela é vista respeitando, não em exclusivo ao governo português ou outro qualquer outro governo particular, mas ao governo, em geral, em qualquer lugar e em qualquer tempo, desde os primórdios, quando Platão, depois de pensar sobre o assunto, resolveu defender que a melhor forma de governo seria aquela que fosse constituída pelos melhores de entre os homens, o que, para ele, ia dar aos filósofos. Esta teoria dos filósofos-reis, teve, ainda recentemente, um acérrimo crítico em Karl Popper (que tinha mais com que se entreter do que com a tradição dos clubes ingleses que João Carlos Espada venera) que dizia, por sua vez, que mais do que optar pelos melhores, o que interessava era preservar as condições de retirada do poder aos que se mostrassem não merecedores dele, coisa que a democracia devia garantir (e que é fácil ver que não garante, mas isto já é outra coisa). Ora, o que VPV diz abertamente é que os últimos primeiros-ministros de Portugal têm sido pobrezinhos de espírito, sem «habilitações», sem qualificação tecno-científica-política de «excelência», e que ninguém se importa com isso, excepto ele. Pois, mas VPV sabe, também, que não é possível tomar de assalto a democracia, subvertê-la, e retirar, sem mais, aqueles que exercem o poder mesmo sem o merecer! Fazer isso seria escaqueirar a tão intocável democracia e provocar um chorrilho de atoardas acerca do espírito democrático. VPV sabe bem que não pode defender a democracia e, ao mesmo tempo, levar à letra aquilo que ele escreve, sob pena de passar de uma simples contradição teórica que ninguém leva a mal, para um grave delito de opinião pública contra as instituições democráticas.