26 fevereiro 2007

Saída idiota

Um dia, explicava José Miguel Júdice, «como num caso daquelas mulheres que, um dia, decidem sair de casa», decidiu sair do PSD, a sua casa partidária desde há 26 anos. Diz ele que não «aconteceu nada de particular», que «não houve nenhuma discussão», mas que aconteceu, assim, repentinamente, e como no caso «daquelas mulheres» que saem sem nenhuma razão aparente a não ser a de acontecer uma vez, a ele deu-lhe «naquele dia», e não havia nada a fazer, tinha de ser.
Nada disto seria estranho, em termos de opção pessoal, se Júdice não poupasse argumentos com vista a esvaziar qualquer outra interpretação que não seja a dele, a de que um dia, deu-lhe… Na verdade, não são argumentos as justificações que dá, mas são mais do que umas tiradas popularuchas, assim com alguma desfaçatez, para matar o assunto e as coisas ficarem por aqui. É aquela ideia de que agora até vai aproveitar para ler, ir ao cinema e ver futebol, como dizia Jorge Sampaio. Mas Júdice não está propriamente a reformar-se da política. Está é a atirar uma cortina de fumo para tapar as vistas e o alcance do seu olhar. Nada que justifique a infeliz ideia de se comparar a uma «daquelas mulheres que, um dia, decidem sair de casa». É que podem existir mil e uma razões para uma «daquelas mulheres» sair de casa, como ainda existem outros tantos homens que não precisam de travestir-se de mulheres para saírem de casa, e saírem nas mesmas condições a que Júdice se refere, assim de repente, «naquele dia», sem nenhum motivo aparente, mas com um carácter de inevitabilidade: tinha de ser um dia. Foi «naquele». Júdice parece insultar as mulheres que sairiam de casa feitas doidas, sem saberem porquê. Júdice parece travestir-se para melhor sentir na sua pele a analogia. Júdice, numa pose de macho, afasta os homens da mesma situação ao comparar-se unicamente com elas e não com os homens que fazem o mesmo que elas. Finalmente, Júdice sentiu que era o seu dia, com todo o direito e liberdade. Escusava era de parecer idiota.