05 fevereiro 2007

Condecorar por «gosto» ou por outra razão?

Cavaco Silva parece ter condecorado «com gosto» várias personalidades. Uma delas é Souto Mouro. A condecoração da Grã-Cruz da Ordem de Cristo é devida pelos serviços prestados, etc, e «cumpre a tradição de homenagear antigos titulares de altos cargos políticos». Sublinhe-se «antigos».
Ora, neste caso, parece haver uma precipitação da parte de Cavaco Silva, mesmo que isso lhe dê «gosto». Não pode haver já o «reconhecimento do Estado e da Nação» quando ainda o imbróglio do «envelope 9» não foi desfeito. Souto Mouro é ainda, quer-se queira ou não, uma personalidade sob suspeita, que ainda não se livrou de ver explodir na sua cara mais outras tantas «trapalhadas» semelhantes às que esteve envolvido, mesmo que por omissão. Por outro lado, a saída de Souto Moura do cargo de Procurador-Geral é recente, demasiado recente, o que colide notoriamente com o requisito para a atribuição desta honraria que é «homenagear antigos titulares» e não titulares saídos de fresco, como é o caso de Souto Moura. É dever da República preservar um espaço de tempo razoável durante o qual a antiguidade se estabelece e se sedimenta, por outro lado, a honorabilidade do homenageado. Assim, à pressa, pode-se homenagear com «gosto», mas não se homenageia com justiça. Pelo menos, com toda a justiça.
Uma tal homenagem, à pressa, sem que o tempo lave o que tem de lavar e separe o que tem de separar, de um trabalho que ficou marcado pela polémica, só seria justificada se se quisesse homenagear alguém à beira da morte. O que não consta que seja o caso.