20 janeiro 2007

O sr. Maliki e o sr. Bush discutem de boa fé?

O sr. Maliki e o sr. Bush discutem de boa fé?

Depois da justiça sangrenta sobre Saddam e seus colaboradores, o sr. Maliki e o sr. Bush trocaram piropos, acusando-se mutuamente de fraquezas, de falta de acção e de ambição. A administração norte-americana reclama sobre o que a administração iraquiana devia fazer e esta, por sua vez, faz o mesmo. Unha com carne, cada uma sabe que tem o destino inexoravelmente nas mãos da outra, e que ambas querem a mesma coisa, a pacificação, democrática ou não, do Iraque, ainda que divirjam quanto aos meios e prazos sobre como fazer isso.
Do que resulta que tem toda a legitimidade se colocar a seguinte questão: e quando divergem desta maneira, qual deles, o primeiro-ministro iraquiano, Maliki, ou o presidente norte-americano, Bush, está de boa fé? A resposta é óbvia: nenhum, porque qualquer um deles está profundamente mergulhado numa lógica de resolução do problema do Iraque, de tal maneira que ultrapassa a necessidade de boa fé para exigir a necessidade do cálculo segundo os objectivos particulares que cada um julga defender melhor, à custa do outro, contra o outro, apesar do outro.
Quando na imprensa portuguesa foi levantada a questão da má fé, retomada também do livro de Fernado Gil, Impasses, a partir da posição dos que apoiaram incondicionalmente a invasão do Iraque, não se deu conta nem se lhes exigiu que se retirassem da trincheira por que tinham optado sob pena de lhes ser retirada o aval da boa fé. É que a boa fé exige um cenário plausível do que merece credibilidade. E a credibilidade não é um sentimento nem guerreiro (À guerra, À guerra!) nem pacifista («Make love, not war), mas uma atitude mental de quem quer emitir uma opinião e para isso sonda o conjunto das opiniões em jogo, e representa-as acrescentando a sua própria opinião que é mais do que a sua, pois, efectuou a síntese das que com ela dialogou. Ao fazê-lo com imparcialidade, aquele que emite a opinião não está comprometido nem com um lado nem com outro, mas apenas com a sua própria consciência e a sua honestidade intelectual, visando o esclarecimento e não a mobilização, visando o entendimento e não a convocatória à acção. Esta é uma ideia da boa fé, que Hannah Arendt expressa em Verdade e Política.