15 junho 2006

Estranho campeonato: 2-2

Ainda não há muito tempo, as coisas estavam por 1-0 e ninguém se aborrecia. Uns budas gigantes a menos, um sobressalto na UNESCO, pareciam alertar as consciências para o que se passava no Afeganistão, país tomado de assalto pelos talibãs contra os senhores da guerra locais. Uma espécie de nova barbárie instalou-se por ali, a sharia a funcionar lesta e pressurosa nos seus princípios religiosos acima da lei, os homens mostrando-se com a barba comprida e as mulheres devolvidas aos recônditos das suas casas. Nem televisão, nem cinema, nem escolas a não ser as madrassas onde o Corão é aprendido como se fosse o único livro existente sobre a face da terra.
Depois, deu-se o 11 de Setembro e o Império, ferido em casa, na sua própria tenda, ergueu-se qual espada fulminante sobre o Afeganistão, tomando-o de assalto de um modo tão fácil que mais de metade da energia e potência ficaram por gastar e realizar. De qualquer maneira, momentaneamente, o jogo tinha ficado empatado: 1-1. A ira imperial tratou logo de desempatar este confronto, aproveitando a mobilização anterior para o Afeganistão, reapropriando-se do elã entretanto gerado e indo parar ao interior de Bagdad, cumprindo o desígnio do anterior candidato a César que se tinha limitado a contemplar as torres da cidade do deserto, mas de fora. O novo candidato a César, aconselhado por uns cônsules treinados nas melhores universidades, achou que devia pisar o solo iraquiano contra tudo e, se preciso, contra todos. Resultado: 2-1.
No outro lado de África, nessa África negra de fome, miséria, subdesenvolvimento, guerra e, mais recentemente, de petróleo, os senhores da guerra da Somália foram expulsos de Mogadíscio por outros senhores da guerra, mas estes de outra estirpe, não fossem eles a União dos Tribunais Islâmicos cuja senha é precisamente a sharia, a lei islâmica. Parece que o Império quis ajudar com armas e dólares os antigos senhores da guerra que estavam no poder desde 1991, acordando à última da hora, quando a realidade do jogo começava a escapar ao seu controlo. Agora, a situação está invertida irremediavelmente nos próximos tempos. Portanto: 2-2.