16 junho 2007

As mudanças do ‘The Wall Street Journal’

No ‘DN’ (15/06) refere-se a «nova mudança organizacional» do ‘‘The Wall Street Journal’, apontando a situação em que a nova estrutura contemplará a integração do noticiário impresso e do online. Para além dos aspectos curiosos sobre a possibilidade desta reestruturação obedecer a critérios de rendibilidade, que permitirão preparar a venda do jornal, salienta-se o aumento do preço de 50% no seu preço de capa, o que não é qualquer aumento mitigado, mas um aumento sério, duro mesmo. Já se antevê o que virá a seguir: redistribuição de tarefas, jornalistas a mais, despedimentos, etc. Nada de extraordinário, como o pode comprovar o jornal que, no caso português, de ‘Público’ passou a ‘P’, mudou o grafismo graças a um designer britânico, reduziu alguma da informação impressa ao nível da produzida nos jornais gratuitos, e institucionalizou o perfil do seu «leitor» como um «navegador», aquele que «lê» tanto a versão em papel como a digital, e passa de uma para outra como quem «navega» na Internet passando de imagem a imagem e de conteúdo a conteúdo.
O que destoa no meio destas grandes viragens nos órgãos de comunicação de massas, é a de, por um lado, no que respeita aos jornais, apregoar-se a sua rápida extinção - do que resulta a necessidade premente da sua súbita conversão -, e, por outro, difundir-se exactamente o seu oposto, o seu crescimento em alguns países - do que resulta não tanto a necessidade de celebrar exéquias, mas a de adaptar toda a indústria a novos paradigmas, do design à «navegabilidade». Quer de um ponto de vista quer de outro, o resultado vai parar ao mesmo, à moda da mudança e da padronização pelo nível mais vendável, pois, do que se trata, no que respeita ao investimento, é do retorno do capital, e neste aspecto, não é propriamente a qualidade que tem a última palavra, mas o poder de atracção que um jornal pode ter junto do público «consumidor» que o paga.
Ora, esta atracção continua a ser postulada da mesma forma tradicional que qualquer outro produto, consoante a moda e obedecendo ao velho critério de que tudo se vende, desde que existam compradores. Hoje, é a moda do design, concebido como a quinta-essência de qualquer negócio, bem como o critério de que vale tudo para conseguir a adesão do público consumidor, e que este, por uma razão ou por outra, há-de sempre submeter-se aos ditames da lei do marketing. Supor-se outros critérios, supor-se que um jornal se faz para um determinado público e que só a esse deve prestar contas e submeter-se, já sai da bitola dos manuais. Supor-se que a esse público o jornal deve a qualidade que o fez tornar-se um objecto de consumo imprescindível, e que praticamente nada deve tocar nessa relação tácita entre jornal e público, a não ser o que decorre da sedimentação sempre renovada dessa relação, é injusto para a moda e para os cânones da mudança a todo o custo. Supor-se que a garantia da qualidade - e do retorno do investimento - pode requerer um aumento substancial do preço (o do ‘Wall Street’ é de 50%!) a que o consumidor está habituado a pagar para ter o jornal que reconhece como «seu», é sempre visto como um mal maior a que se recorre quando a concorrência parece alinhar pelo mesmo diapasão. Supor-se que esta sociedade anónima, que ajuda a produzir e a consumir um jornal, tem de assimilar-se a um povo como se este fosse todo ele feito da mesma matéria e qualidade, seria a mesma coisa que pensar-se que, pelo facto de os jornais andarem todos a proceder às suas reestruturações, ficando cada vez mais iguais entre si, também o «leitor» seria uma categoria universal igual em todo o lado, da primeira à última página do jornal, com uma forma indistinta de leitura, e, em última análise, incapaz de discernir sobre o tipo de jornal que prefere, seduzido, como é «natural» que se pense, pela eficácia dos condicionalismos exteriores ao próprio jornal.
Que a qualidade de um jornal diário seja paga por um público exigente disponível para tal, é algo que ainda falta concretizar. Ao invés, fazer passar uma coisa disforme, igual a tantas outras que assim obtêm forma, pela qualidade de conteúdos de referência, é assunto de moda. Em casos específicos, trata-se de uma questão de bolsa.