20 setembro 2007

A «reforma» do ensino na Venezuela de Hugo Chávez

Segundo parece, o actual governo venezuelano não está por menos: «substituir a escala de valores capitalistas por outra centrada no ser humano (…) e transcender o colonialismo eurocentrista». A ideia até nem parece má, uma educação «centrada no ser humano» em vez de, por exemplo, no dinheiro, ou na guerra, tem sentido, ou faz sentido. Mas a base que deve sustentar essa mudança é de outra ordem: em vez de figuras de conquistadores e de colonialistas, interessará a «essência indígena, afro-americana, mestiça e pluricultural». Trata-se de dar mais valor à prata da casa do que aos ídolos importados e à cultura provinda de países imperialistas. Trata-se de inculcar os quatro valores bolivarianos: «aprender a criar, aprender a participar e a conviver, aprender a valorizar e aprender a reflectir». Ora, vistas bem as coisas, este conjunto de princípios é por si só inócuo, e não será por isso e por Chávez pretender criar uma «ideologia» de raiz que haverá algo parecido com o problema que merece a crítica da oposição: o de estarem a «inocular» o «vírus do comunismo» nas criancinhas. Ora, os portugueses até aprenderam que os comunistas comiam-nas ao pequeno-almoço, mas nunca apanharam nenhum em flagrante delito…
Por outro lado, criar uma espécie de educação tão indiferente à concepção cosmopolita do mundo, obrigará Chávez a fechar a Venezuela para obras, isolando o país das influências «malignas». Pior ainda, obrigará a Chávez a criar uma outra economia original de modo a não ser contagiado pela economia capitalista que grassa por todo o mundo, incluindo na China comunista! Mais grave ainda, aqueles quatro pilares da educação bolivariana podem ser adoptados como fundamento para o ensino de humanidades e coisas afins, recriando uma espécie de «eduquês» à venezuelana que não deixará, com certeza, de merecer a dura crítica dos críticos do «eduquês» à portuguesa. Ainda se aqueles pilares apontassem o ensino das ciências, das matemáticas, o ensino da ideologia científica-tecnológica, os critérios da eficiência, da produtividade, dos ganhos de mais com menos, da separação do que interessa e não interessa, do útil e do inútil, o proveito da última tecnologia, o lucro do último invento, as previsões dos próximos milagres científicos e técnicos…, ainda se esta ideologia anti-«eduquês» fosse o sustentáculo da reforma de Chávez, poderia ser que valesse a pena esperar para ver os resultados, mas assim, com estas proclamações ("aprender a criar, aprender a participar e a conviver, aprender a valorizar e aprender a reflectir"), nada de bom é possível de se esperar. Assim, Chávez até cria a ilusão de que está a copiar a fórmula do «eduquês» português: «aprender a aprender».