26 novembro 2007

A barbárie, segundo Daniel Sampaio

Daniel Sampaio encontrou, num único número do ‘P’ de um domingo passado (18/11), diferentes visões do mundo, de Portugal e do homem português, que convergiam de tal modo para a catástrofe, que não se conteve na lamentação que escreveu passados oito dias: «pessimismos de intelectuais ou visão realista de uma sociedade abúlica e submissa, onde é difícil fazer ouvir uma voz diferente? (pela minha parte, senti-o na pele: ao intervir, como Presidente do Júri, na cerimónia de entrega do Prémio Nacional de Professores, verifiquei como os nossos governantes têm dificuldade em escutar uma voz crítica - ao chamar a atenção para o mal-estar entre governo e professores e ao propor um novo relacionamento entre governo e docentes, recebi como resposta o auto-elogio da acção governativa...).
Ora, o equívoco de Daniel Sampaio assenta na apreciação que faz de si próprio acerca do papel da sua voz no quadro do exercício do poder da maioria absoluta socialista. Não percebeu, primeiro, que ao ser convidado para presidir ao Júri e à cerimónia de entrega dos Prémios do Concurso Nacional de Professores, ele caucionava uma política da qual julgava que podia distanciar-se criticamente, nomeadamente ao pronunciar-se sobre a necessidade da reconciliação entre docentes e governo. Depois, equivocou-se novamente ao esperar que o governo lhe reconhecesse a parcimónia de um contributo para esse diálogo, quando aquilo que lhe tinha sido pedido era que executasse com destreza o ritual de mestre-de-cerimónias e não que abrisse a boca para exercitar a crítica em nome de qualquer apaziguamento. Finalmente, ao expor publicamente a decepção perante a resposta que obteve, Daniel Sampaio coloca-se na pele de despeitado, forçando a nota e provocando a leitura vitimizadora sobre a forma como foi tratado, quando também deveria ter percebido que, no jogo de poder, o governo (qualquer governo) não usa apenas aqueles que sabe que pode e que deve usar, como usa também aqueles que julgam erradamente que ao serem usados estão na realidade a usar o poder.